sábado, 16 de outubro de 2010

Medicina Diagnóstica

Outro dia conversava com uma amiga sobre os tantos exames médicos a que nos submetemos. Por um lado, é fantástico acompanhar o progresso tecnológico, com seus scans e afins; por outro, nos surpreendemos um pouco a serviço dele, algo como o feitiço virando contra o feiticeiro. Ela comentava sobre custos (subjetivos, já que tem direito a plano de saúde) entre consultas médicas e exames e expectativas acerca do resultado dos exames e diagnóstico e prognóstico. O tema envolvia um que de nostalgia.

Hoje, sábado de manhã, fui fazer um ecocardiograma com doppler colorido, eco para os íntimos. Amanhã, provavelmente um lindo domingo de sol ameno, irei colocar um holter para investigar durante 24 horas o que anda fazendo o meu coração. Antes disso, ontem, estive oferecendo meu sangue para análise de eletrólitos e ainda devo ao laboratório material para verificação de possíveis elementos anormais e sedimentares. Claro que tudo isso foi recomendado por um médico a quem eu procurei pedindo orientação por não estar me sentindo bem. Há mais de um mês sinto palpitações, meu coração anda pulando mais do que o normal e às vezes por um tempo longo demais, esperei que ele se tranquilizasse a seu tempo, mas, como ele estava resolvido a continuar com o mau comportamento, resolvi procurar conselho especializado. Liguei e marquei uma consulta para duas semanas depois, nesse ínterim, imaginei que talvez não precisasse mais e, quem sabe, poderia desmarcar, pois o coração resolvia a seu bel prazer dia e hora que iria saracotear - da mesma forma que o joelho esquerdo, que dói a hora que bem entende, sem maiores motivos e explicações. Enfim, na quinta passada consultei-me.

Voltando à manhã de hoje. Eu não conhecia o endereço onde faria o exame, pois é um novo anexo do hospital. O rapaz com quem falei por telefone para marcar me informou a localização, pensei saber onde ficava, mas dei uma confirmada no Google. Não pude deixar de lembrar da conversa com a minha amiga do início do post. O anexo hospitalar funciona num teatro que já não funcionava há anos. Num prédio de arquitetura antiga, com florões, algumas partes do piso em mármore. A pintura é na cor areia, nova, limpa, asséptica, estéril. Persianas modernas, novas, na cor areia, combinando. Bromélias pegando um solzinho junto a grandes vidros que garantem iluminação natural. Na frente, ainda antes da entrada, um mini parquinho infantil com aqueles brinquedões de plástico. Pessoas - poucas, fazendo seu serviço educadamente e o mais silenciosamente possível. Letreiros indicativos na cor azul: acesso restrito, exame, saída; a expressão medicina diagnóstica é vista em placa azul grafada com grandes letras brancas.

Também não pude deixar de pensar em o que leva um teatro a ficar fechado por anos e o que leva à multiplicação em progressão geométrica de matrizes, filiais e anexos para o cuidado com a saúde ou atenção à doença ou medicina diagnóstica. O quê?

Estava até agora pensando nisso, então resolvi escrever para pensar melhor e para compartilhar essa sensação. Porque parece tudo muito óbvio, muito correto e adequado - afinal são mais unidades de atendimento para (uma parte) da população; mas eu fico perplexa, talvez nem tanto, acho que surpresa ou um pouco indignada. Afinal, por que mudamos tanto as nossas prioridades? Que valores são caros para nós? O que queremos da vida? O que esperamos dela e o que fazemos para que ela flua em conformidade com nossos desejos? De que temos nos alimentado? Em que medida não nos cuidamos verdadeiramente? Que uso fazemos do conhecimento?

7 comentários:

Claudia Sciré disse...

estamos na era da biopolítica, de que fala Foucault!
espero q não seja nada! bjs

Érima de Andrade disse...

Que bom que dividiu com a gente, mas vou querer saber também o que anda fazendo seu coração andar aos pulos.

Talvez com mais teatros funcinando, mais divertimentos, brincadieras, risos, os anexos hospitalares nem fossem necessários... bjs

Juliana Veiga disse...

Como diria o já mencionado Foucault: o que estava em jogo era a medicalização geral dos comportamentos, das condutas, dos discursos, dos desejos..

beijos palpitantes, palpitados e estalados!

Góthica disse...

Minha querida amiga, é isso aí,a vida agora é um turbilhão de stress e ansiedade,não estranho mais ver tantas pessoas doentes no corpo e na alma..amiga passei por isso,meu coração, palpitava sem mais nem menos quase todos os dias,fiz todos estes exames e deram nada!!!só descobriram que eu tenho um ritmo cardiaco um pouco mais elevado, o que se concerta com exercicios,nada mais...contigo vai ser igual,..me manda noticias..Bjus. Deus te abençõe..

Sandra Morena Lamhut disse...

Faço check-up todo ano para não ser surpreendida, prefiro ficar ligada...a idade tá chegando eu sei mas a gente pode chacoalhar a vida e não ficar de bobeira esperando a morte chegar.
Não adianta reclamar...tem mesmo que pegar no pesado...kkk Já pra academia, caminhar na praia todo dia...dançar...beijar na boca...
Bora fazer trilha comigo, subir montanha...fazer rapel...se o joelho doi (tb doem os meus)a gente dá uma paradinha, respira e continua. Voce vai amar que eu sei, pq gosta de caminhar.

Lisandra G. Braga disse...

Oi Carol! Adorei seu momento de expressão. Consegui me ver em várias de suas palavras e de forma encantadora em seus detalhes.

Espero que o tum-tum do seu coração possa cantar e dançar em seu equilibrio necessário! E estou por aguardar novos escritos seus.

Grande beijooo!

Boa semana,

Lisandra

Luciene disse...

e cá estamos nós, em dores de e-cornos da pós-modernidade traduzidas em linguagens difíceis, da maquinaria que derruba as brincadeiras de fazer criar.
e ficamos sem teatros. desalento.
e o coração, apontador dos nossos aprontos, também aponta para as investigações que vão além das máquinas.
cuida desse aí, que, irreverente, certamente arranjou um jeitinho de dar um confere no teatro e na coreografia do novo elenco.