quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Será que eu estou inventando? *

Parece que é sobre contradições humanas.
O nome instiga e é brasileiro.

Lembro de Um Beijo Roubado. Como daquela vez, sou a primeira no cinema. Calor, silêncio, naquele dia escrevi: o vazio não é o contrário do cheio, o vazio é o todo. Filme bom demais.

Cheguei cedo, depois de um convite que permaneceu sem resposta até quase o fim do filme. Um mate, vitrines e fui passar o tempo na livraria. Saí de lá com O Corpo Impossível embalado no plástico amarelo da Saraiva.

Ainda era cedo e folheava minha mais nova aquisição quando um cara de camisa listada sentou na outra ponta do banco. A camisa dele era um marco, algo que se via de longe, como o plástico amarelo da Saraiva. Sabe quando você percebe que alguém está querendo ler o que você está lendo? Pois é.

Subi, cheguei primeiro, relembrei a sensação do vazio que é o todo e logo as pessoas começaram a chegar  com seus imensos baldes de pipoca e coca. Ah, hoje eu não resisti, e nem ontem.

O cara de camisa listada sentou na mesma fila que eu, algumas cadeiras para a direita.
O filme mostrou-se inconstante, momentos bons outros nem tanto, o final inesperado me agradou, apesar de.

Saí e recebi a resposta ao convite, tarde demais. E agora as contradições eram as minhas no pós-filme. Com frequência me ocorre de não definir se gostei ou não, por vezes demoro dias.

Enquanto andava ia escrevendo uma mensagem no celular e segurando o marco amarelo, desci a escada e fui descendo e descendo todas as escadas em direção à rua. Às vezes percebia o marco listado, que parecia observar meu caminho e depois passar a frente como se quisesse que eu o observasse também.

Até chegar à rua, quando ficou para trás. Nesse momento achei que estava sendo, mais do que observada, seguida.

Atravessei as ruas sem olhar pra trás em direção ao ponto de ônibus. Depois olhei e não vi nada além de outras camisas, outras cores, outros marcos. Subi no ônibus que me deixaria na esquina de casa. E aí ele também subiu e olhou para o desembarque a cada parada que o ônibus fez; foi só.

Desci primeiro, com O Corpo Impossível no plástico amarelo. Comprei uma coca zero. Pensei no marco, nos marcos e na falta de ação efetiva do camisa listada, e na minha também, talvez se a camisa fosse lisa.


* Sempre lembro do Márcio Ramos, do Vida Maria, quando penso isso.

Um comentário:

Rogério Sacchi de Frontin disse...

O silêncio, às vezes, é só silêncio, outras obstáculo que parece intransponível.